14 novembro 2006

Nossa Senhora da Assunção


Ontem o passeio começou pelas duas da tarde. Deveria ficar em casa a preparar a minha dissertação de mestrado mas, como temos um ministério da educação que desvaloriza a formação dos professores, não me sinto muito motivado para continuar o “investimento” que tenho feito até agora na minha carreira. Passar mais 20 anos a saltar de terra em terra, com os filhos e a casa às costas, é um cenário que tira o entusiasmo a qualquer um.
O nevoeiro tem marcado presença por aqui. Parece ser habitual por Vila Flor. Para quem gosta de apreciar a vista em redor não é muito agradável mas também não é uma coisa que se possa optar. Decidi subir ao alto da Serra do Facho. O nevoeiro cobria todo o Vale da Vilariça, beijava as primeiras casas de Vila Flor e chegava às imediações do Parque de Campismo. A Norte a situação estava igual. Em Vilas Boas o nevoeiro tapava tudo ao longo do Rio Tua. Mais para Norte, em direcção ao Cachão e Mirandela, era um imenso Mar de nuvens brancas como já não via há muito tempo.
As vistas, a mais de 700 metros de altitude, eram magníficas mas sei como é difícil captar esse ambiente com a máquina fotográfica. - Do alto do cabeço do Santuário de Nossa Senhora da Assunção não seria um espectáculo ainda melhor? Foi para lá que me dirigi.
Desci da Serra do Facho por um caminho pouco recomendável, cheio de pedras e silvas, até à Zona Industrial de Vila Flor. Continuei pela estrada em direcção a Vilas Boas. Neste pedaço de caminho lembrei-me do Planalto Mirandês e das minhas aventuras À Descoberta de Miranda do Douro. A tarde estava agradável com um sol brilhante e um ar frio que facilitava a pedalada.
Algumas pessoas procuravam cogumelos. – O nevoeiro vai dar cabo deles. Disseram-me. Pelo diminuto saco que traziam conclui que a recolha não terá sido abundante.
Antes de chegar ao Santuário há uma subida que me deu tempo para recordar as grandes festas da Senhora da Assunção.
Quando eu era garoto, ficava um ano inteiro à espera desta festa. A minha alegria maior era receber uma corneta plástica ou um tractor rústico feito de chapa. Mais tarde, comecei também a vir à festa. A carrinha de caixa aberta do Zé Madeira, a abarrotar de gente, era o taxi da época. Quando via o chorão e a igreja de Samões sabia que o "cabeço" estava próximo e começava a ouvir ao longe o barulho dos foguetes, a música das cadeirinhas, dos aviões, dos carrinhos de choque e do poço da morte. A par da alegria da música e dos divertimentos, estava a grandiosidade da procissão e a merenda. A merenda vinha em cabazes de verga, cheios de coisas boas e cobertos por panos alegres. Comprava-se um melão e uma melancia e, depois da procissão, a família reunida recostava-se à sombra num pinhal. Os cabazes abriam-se, espalhavam pelo chão os nossos sabores que eram degostados com calma, numa comunhão muito espiritual mas cheia de alegria.
Seguia eu neste pensamentos quando cheguei ao Santuário. Está tudo muito verde à excepção dos castanheiros que vão perdendo as castanhas e as folhas.
Subi lentamente, saboreando a paisagem e agradecendo a Deus estes momentos de paz, longe das polémicas do ECD ou de centenas de crianças gritando. Quando cheguei ao topo, enchi o peito de ar e saí voando por sobre o colchão de algodão que se estendia em várias direcções.
Andei por ali, aproveitando os raios de Sol, procurando um ângulo nunca fotografado ou uma outra forma de ver as coisas.
Este Santuário que se ergue a 760 metros de altitude, tem uma história milenar como prova a existência de um castro do período pré-romano. O miradouro é um dos mais importantes senão o mais importante e o maior santuário mariano do Nordeste Trasmontano. A igreja principal é barroca, mas há mais de meia dúzia de capelinhas espalhadas pelo recinto do santuário.
Entretanto encontrei uma senhora que me mostrou a capela, falou-me de Vilas Boas, dos montes em redor, do seu marido que foi recentemente operado. Votos de uma rápida recuperação.
Fiquei a saber que nos montes que se erguem a Norte do Santuário existiu uma capelinha em ruínas. O sino da capela foi levado (pelos de Meireles, dizem) e ao santo foi levantado um pequeno monumento à saída para Meireles. Quem sabe um dia destes ainda me aventuro a subir aqueles enormes montes!
Parti em direcção a Samões. Todos os santos ajudaram (era a descer) e cheguei rapidamente. Na escola ainda se ouviam as crianças o que significava que ainda não tinham chegado as cinco horas e meia. Atravessei a aldeia e cortei à esquerda em direcção à Albufeira do Peneireiro. O objectivo era saber se com tanta chuva, o nível das águas já tinha subido ou não. Não é evidente qualquer subida desde o dia 30 de Outubro. Serão necessários muitos mais dias de chuva para que a reserva de água seja reposta. E Vila Flor bem precisa, porque a que circula na rede é de muito má qualidade.
Ainda pensei em beber uma águinha no Bar da Barragem mas o frio nas pernas despidas começava a fazer efeito.
Pedalei até Vila Flor onde cheguei ao início da noite, com as costas suadas e as pernas geladas.
O passeio foi curto em quilómetros ( 22 km) mas grande nas emoções, cheio de silencio, de recordações e de muitas fotografias (com algum nevoeiro).

Quilómetros percorridos: 22
Total de quilómetros: 41

11 comentários:

Anónimo disse...

É sempre muito agradável ler descrições com esta qualidade de entrega, que denunciam acto(s) de enorme coragem, face às diversas vicissitudes...
Do(s)(a) ...TEMPO...TEMPOS...VIDA...
OBRIGADA! Revi-me, vivendo: nos locais, na alegria de festa da festa, do ser-se mais nesse dia - criança, seguramente, mais feliz, nas gentes, nos costumes, no enquadramento paisagístico, nas preocupações, na solidariedade, no FUTURO...
Com outra leitura, mais encontrarei...
Sinceros Parabéns!
Esmeralda

Anónimo disse...

Passei para desejar óptima semana.

AG disse...

Obrigado Esmeralda. O que nos distingue dos animais (não tenho a certeza) são os sentimentos. Sentimos quando temos sensibililidade. Ou nascemos com ela ou desenvolvemo-la e nisso não há sexo, cor raça ou credo. Uma das fotpografias que tirei no Santuário está a fazer sucesso, num outro site meu, junto de pessoas de todo o mundo que nunca sonharam que este lugar existia.
Há quem dê valor ao que é verdadeiro...

AG disse...

Viva Sr. Jofre
Obrigado pela visita. Acrescentei o seu Blogue às ligações deste. Vila Flor merece que estejamos juntos na sua divulgação.
Cumprimento, ... volte sempre.

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Anónimo disse...

Aníbal
Apetece-me escrever:
No manto alvo dos céus se confunde a revolta espuma de um mar que o meu olhar feliz consente.
Mais uma vez OBRIGADA!

(No dia seguinte à recolha das images (14/11), o meu filho sobrevoou esse espaço às 9h e 26m da manhã, pela primeira vez. Estas fotos são muito belas por si só mas, também as admiro - "vendo-o lá"...)

Esmeralda

Carlos disse...

Finalmente encontro fotografias da minha terra, Vilas Boas e deste magnifico santuario o de Nossa Senhora da Assunção.

Muito obrigado

Anónimo disse...

DEPOIS DE VER ESTAS FOTOGRAFIAS, FIQUEI AINDA MAIS ORGULHOSA DE TER NASCIDO NESSA BELA TERRA VILAS BOAS E DO SANTUARIO DA SENHORA DA ASSUNCAO.

MUITO OBRIGADO PELAS BELAS FOTOS

EFIGENIA

Anónimo disse...

Os meus parabéns pelo site e pelas fotografias, estão lindissimas, para quem se encontra tão longe das nossas paisagens, é uma alento ver estas fotos e sempre dá para matar saudades. O meu obrigada e continue o bom trabalho, pois para quem não conhece trás-os-montes, este site servirá de referência e aguçará a curiosidade para visitar o concelho de Vila Flor. Uma foto de Vilas Boas apartir do Santuário, ou do sitio do faro, seria uma boa aquisição para o seu site.
Com os melhores cumprimentos Ana Rodrigues

Anónimo disse...

Que Bom matar as saudades da nossa terra que nos viu crescer com essas magnificas fotogafias e essa tâo bela reportagem Obrigado de todo o Coraçâo..

Anónimo disse...

Lindo, não existem palavras para descrever tais fotos e respectivos comentarios, só tenho de dar os sinceros parabens a quem as cá colocou, pois todos os filhos da terra gostam e adoram de ver as suas raizes. Sou natural de Meireles (Alberto Rodrigues), um grande e forte abraço para todos