13 julho 2008

Pela Ribeira da Cabreira, em Freixiel


12-07-2008 Tinha o dia de hoje reservado para acompanhar um grupo de pessoas que ia percorrer a Linha do Tua. A comunicação falhou, de forma que só me restou definir o meu próprio percurso. A primeira ideia, seria eu fazer a pé, a parte da Linha do Tua que percorre o concelho de Vila Flor. No fundo era isso que eu tinha pensado fazer, para acompanhar o grupo de caminheiros que iria percorrer toda a linha, em vários dias.
O concelho de Vila Flor começa a poucos metros do complexo do Cachão, onde o acesso é fácil. A estrada Cachão-Vilarinho das Azenhas acompanha a linha. O limite entre Vila Flor e Carrazeda de Ansiães não é tão acessível. A marcação entre as freguesias de Pereiros e Freixiel, percorre uma zona agreste, entroncando no Rio Tua, algures entre as estações de Abreiro e Codeçais. O ponto de referência é a Ribeira da Cabreira, embora os limites das freguesias não a acompanhem. Com chegar a este local? Tive uma ideia! Porque não ir até Freixiel e descer ao longo da Ribeira da Cabreira? É fácil imaginar, difícil de acreditar, mas não estamos a falar de descoberta e aventura?

Por volta das 11:30 horas estava na Rua da Estrada dos Folgares, em Freixiel. Já há muito que tinha germinado a ideia de acompanhar a Ribeira da Cabreira até à foz, no Rio Tua. Ainda era muito jovem quando a percorri, Cabreira abaixo, até Freixiel, tinha agora oportunidade de terminar a tarefa.
O percurso estava traçado: desceria até ao Rio Tua/Linha do Tua, tentando acompanhar de perto a Ribeira da Cabreira; percorreria a Linha do Tua, até ao Cachão, passando por Abreiro, Ribeirinha e Vilarinho das Azenhas; voltaria a Vila Flor, de carro. Este itinerário deixava-me pouco mais de 20 quilómetros para percorrer a pé.
Deixei a aldeia, em direcção à ribeira. Acompanhei-a durante pouco tempo. Desviei-me depois, por entre vinhas e oliveiras, em direcção às sepulturas escavadas nas rochas, no Salgueiral. Neste local já estive.
O dia prometia. O céu estava azul, povoado de nuvens brancas. A temperatura era alta, mas fazia-se sentir um ventinho ligeiro, amenizando a caminhada. Ia ser uma tarde farta de "disparos".

Em tempos idos, toda esta zona dos terrenos onde me deslocava, esteve alagada. As águas da Cabreira e do Pelão juntavam-se no local onde está hoje Freixiel. Não deve ter sido fácil rasgar no etéreo granito uma saída, serpenteando entre altas montanhas, até ao Rio Tua. Quase pude adivinhar o local, quando percorri as rochas que dividem dois mundos: o vale fértil onde se situa hoje Freixiel e o percurso agreste que se seguiu, com enormes blocos de granito sob os quais a ribeira desaparece, para surgir mais abaixo, sempre agitada, fugidia e transparente. A partir deste ponto, a paisagem parou no tempo. Adivinham-se os caminhos sufocados pelo mato; vêem-se, de onde em onde, oliveiras selvagens, sobreviventes; a única mostra da mão humana, são os sobreiros, sem cortiça. Os sobreiros são os únicos que sobrevivem, à medida que os homens abandonam as terras, limitando-se aos terrenos mais férteis, em voltas das aldeias.
A certa altura o caminho terminou, eu sabia que isso ia acontecer. Fui progredindo no terreno alternando de margem, tentando aquela que me parecia mais favorável. Era impossível seguir pelo leito da ribeira.
Ainda muito próximo de Freixiel encontrei as ruínas de alguns moinhos, penso que se chamam os Moinhos da Peiada. Arranhei-me todo nas silvas, mas não consegui seguir em frente sem lhes fazer uma visita completa. Há dois moinhos, cada um com rodízios, mas construídos em cascata, ou seja, a água, depois de fazer funcionar o primeiro moinho, era aproveitada pelo segundo, ideia também utilizada nalgumas barragens hidroeléctricas.
Continuei ribeira abaixo. A certa altura pareceu-me ver um cintilar azul metálico, sobre uma rocha! Era mesmo verdade, um guarda-rios (Alcedo atthis) exibia-se! Fiquei atrapalhado! Queria trocar a objectiva, mas tinha medo que a ave se fosse embora, são muito rápidos. Nem tentei aproximar-me mais, tentei a fotografia mesmo assim.

Mais abaixo encontrei a estrutura de uma antiga ponte, já destruída. Não tem acessos, deve ter sido abandonada há muito tempo. Faria esta ponte parte de uma rede de estradas, com ligação à antiga ponde de Abreiro? Em Pereiros há uma ponte romana, na Ribeira das Lages, que aqui se junta à Ribeira da Cabreira. O pilar, no leito da ribeira, tem as juntas rusticamente tapadas com cimento. Qual será a antiguidade desta ponte? É uma boa questão a investigar.
Pouco depois encontrei um pontão, recente, permitindo aos veículos atravessarem facilmente a ribeira. Este caminho vem de muito perto da ponte romana, Ponte das Olgas, de que falei. Segue directamente até ao rio, e eu aproveitei para seguir por ele. Os limites da freguesia de Pereiros ultrapassam o leito da ribeira, subindo ao cume da Serra Tinta, seguindo por ele até ao rio. Estava, portanto, em território do concelho de Carrazeda de Ansiães.
O caminho é bom, compreende-se, segue por entre valados de vinhas jovens, modernamente plantadas! Estou em querer que este caminho deve ser muito antigo. Pereiros não consta das estações da Linha do Tua, desde o seu início, então de que são aquelas ruínas que estão junto à linha, perto da foz da Ribeira da Cabreira? Estas ruínas intrigaram-me da primeira vez que por ali passei, a caminhar. Agora ainda fico mais intrigado por saber que há um caminho, bastante bom até, que liga este "fim-de-mundo" à aldeia de Pereiros.
Cheguei ao Rio Tua às duas horas da tarde. Fiz questão de descer ao rio e ir ao exacto local onde as águas da ribeira se diluem, no ainda grande caudal. Espreitei a ponte do comboio que salta a ribeira e preparei-me para a segunda etapa, agora já em terreno meu conhecido.

A aventura continua, pela Linha do Tua, talvez amanhã...

2 comentários:

Anónimo disse...

O Aníbal é mesmo um aventureiro, amante da Natureza!!!
Nunca percorri tão grande distância, mas lembro-me do tempo em que os moleiros de Freixiel vinham buscar à aldeia os sacos de grão de centeio (era o mais comum nessa altura) para moerem nesses moinhos e depois regressavam com a farinha, depois de se pagarem com a respectiva "maquia".
O local mais distante que eu frequentava era a Moreirinha, lá para baixo, bastante longe da Ponte do Vieiro, onde os meus pais possuiam um pequeno terreno com videiras e figueiras...
Lembro-me também de ouvir falar na Serra Tinta, mais lá para o fundo,onde imaginava coisas diversas, mas onde nunca fui.
As fotos são fantásticas e a descrição da caminhada é fabulosa!!!
Aníbal, continue a levar-nos "pela mão" a esses lugares alguns conhecidos, e outros não, mas tão bem descritos que até parece que estamos lá... Parabéns.
Cumprimentos
Anita

Anónimo disse...

Olá
Isto faz-se???? Estou roídinha...
Não é que se podia adiar mais uma semanita???
Não senhora. Estou só a brincar.
Que belo passeio; que belas fotos; que bela descrição; que rica lição de História; que rico dia...onde AINDA O TEMA INCIDE EM ESPAÇOS DE ÁGUAS...LIVRES. OXALÁ NÃO AS PRIVEM DO/NO SEU CAMINHAR...
Obrigada e parabéns, mestre Aníbal!
(tenho que combinar com a Eulália... para uma desforra...)
Abraço-vos com (já) muitas saudades.
Esmeralda