Em nenhum mês tive tanto trabalho em descobrir a Flor do Mês, como em Dezembro! E, ainda bem que assim foi, porque acabei por escolher a flor que não existe ou seja a não flor. Passo a explicar: para quem como eu acredita na evolução das espécies, compreende com facilidade que há milhares de anos atrás nenhum ser vivo seria como é hoje. Acontece que a flor, tal qual a conhecemos hoje, é uma adaptação altamente especializada das folhas das plantas tendo em vista a reprodução. Os meus alunos riem em surdina quando lhes digo que quando estamos a cheirar ou a cortar uma flor, estamos a cortar os órgãos sexuais das plantas. É que as flores também têm sexo, a maior parte delas tem os dois sexos!
Há milhares de anos as plantas não possuíam certamente a complexidade que hoje têm, nem ao nível da reprodução, nem ao nível do próprio sistema vascular. As plantas vulgarmente designadas Plantas sem flor, não podem ter flores mas isso não impede que a sua reprodução seja sexuada. É precisamente aqui que entra a curiosidade da escolha destas plantas no mês de Dezembro.
Estas plantas chamadas cientificamente de briófitas (bryon, quer dizer musgo em grego), não têm vasos condutores de seiva, por isso não podem crescer muito. O transporte de substâncias dá-se por difusão entre as células.
Explicar a fecundação é impossível sem recorrer a uma série de “palavrões”, vou tentar ser simples, é sempre bom aprender.
Basicamente os musgos têm duas gerações, numa delas ocorre a reprodução. A parte mais verde do musgo, ou seja aquilo que normalmente estamos habituados a ver é o gametófito e aquela a que um leigo poderia chamar “flores” são os esporófitos. No topo do esporófito está uma cápsula (anterídio), que tem dentro anterozóides. É precisamente a água que faz com que essa cápsula se rompa e permitem também aos anterozoides, que são flagelados (têm um “rabinho” como os espermatozóides!) consigam nadar até à oosfera fecundando-a (os arquegônios crescem também no gametófito e cada um produz uma oosfera). A água é imprescindível neste processo, por isso a reprodução acontece no Inverno e os musgos vivem em locais sombrios, nas rochas, no chão ou nos troncos das árvores.
As fotografias foram tiradas num dia geladíssimo, 27 de Dezembro, atrás da serra e junto dos ribeiros de Roios. Estão representados quatro espécies de musgo distintas. Foi um grande desafio e fiquei muito contente com o resultado.
31 dezembro 2008
30 dezembro 2008
Procurando o caminho
Meireles tem sido nos meus passeios um dos locais mais inacessíveis do concelho. Eu sei que parece estranho, uma aldeia situada no coração de um vale revelar-se pouco acessível, mas de facto assim é. Nas minhas andanças, de BTT, a pé ou de carro, procuro quase sempre caminhos alternativos. A estrada asfaltada não é o lugar certo para quem quer andar devagar.
Das várias vezes que me desloquei a Meireles, sempre tive imensas dificuldades, porque procurei sempre uma abordagem pelo nascente, ou seja por terrenos de Vale Frechoso. O vale tem muitos acessos pelo poente, embora também haja zonas bastante rochosos, como o Faro. Hora, estou em crer que estas duas localidades não se devem dar muito bem, porque nunca procuraram abrir uma via de comunicação entre elas.
A minha mais recente tentativa de encontrar um caminho aconteceu no dia 20 de Dezembro. Fui de carro até cerca de 1,5 km do cruzamento da estrada de Vale Frechoso com a N214. Do lado esquerdo da estrada há uma zona de giestal onde foram abertas muitos corta fogos numa área ainda pertencente a Vale Frechoso que penso chamar-se Feiteira e Carvalhinho.
À minha esquerda via ao longe a Fonte do Seixo e o Cabeço dos Gaviões, onde adoro subir. À minha direita via recortado no horizonte o marco geodésico da Rosa, onde também já estive algumas vezes. À frente, entre mim e Meireles, adivinhava (mas não via) alguns cabeços rochosos, incluindo a Fraga Amarela.
Mal me afastei um pouco do caminho cheguei (de novo) à conclusão de que não é fácil andar por aqui. O mato é composto por giestas, estevas, carquejas, urzes e silvas. Atinge mais de um metro de altura e rasga tudo onde se espeta, seja tecido, seja carne. Encontrei dois bandos de perdizes, pelo menos elas gostam de andar nestes locais.
Procurei um ponto alto para me localizar. Os afloramentos rochosos atraíram-me e tentei romper por entre o mato para os alcançar. Desisti de procurar um caminho!
Quando me aproximei dos rochedos, uma ave de rapina que neles vigiava a paisagem, levantou voo. No meio da vegetação descobri algumas pedras ainda cobertas de geada. Há muitos amontoados de pedras soltas por todo o lado, estes terrenos devem outrora ter sido utilizados para a cultura de cereal. Pareceu-me que estes amontoados tinham uma configuração intencional, em curva, como que protegendo um pequena zona plana junto às rochas.
Aqui pode ter existido um castro! Há em redor muitos locais com evidências semelhantes, quase todas elas em pontos altos, com uma enorme protecção natural. São exemplos o Cabeço, o Faro, o Maragoto, o Facho, só para citar alguns. O lugar onde me encontrada estava naturalmente protegido num raio de mais de 180º, bastava uma pequena muralha para proteger quem quer aqui se quisesse proteger. Em termos de subsistência, o vale fértil, um pouco mais abaixo, a menos 200 metros de altitude não faltam bons terrenos e água, onde até rolavam moinhos. Pode ser imaginação minha, mas também pode não ser.
Em direcção ao aterro sanitário intermunicipal elevava-se uma escarpa rochosa que parecia intransponível. Impelido pela adrenalina das alturas, dirigi-me para ela. Havia várias grutas naturais escavadas nas rochas. Devem ter sido usadas durante séculos por pastores e caçadores, e sabe-se lá por quem mais. Numa delas havia uma curiosa construção de pedras soltas, estava ali a mão do homem. Noutra, muito maior, que tinha até uma abertura no tecto, adivinhava-se o desenho de algumas paredes rústicas já desaparecidas. Senti-me um verdadeiro homem das cavernas. O cenário ajudava a transportar-me para o época das cavernas, com a luz leitosa a tentar rasgar o nevoeiro do vale que, pouco a pouco, se sumiu num cachão do Tua, no Cachão. A luz, o frio e o silencia era tudo o que ali chegava. Sentei-me nas rochas sorvendo a paisagem, até que o sol se abeirou do Cabeço.
Quando o sol se escondeu, senti frio. De regresso à estrada surpreendi algumas codornizes que se preparavam para passagem a noite no restolho. Os últimos raios de sol pintavam de mosto o cume de Bornes.
Mais uma vez não descobri um caminho para Meireles, mas, e depois? É olhar que permite os mais belos passeios, mesmo quando os nossos passos não nos permitem atravessar todos os vales.
Das várias vezes que me desloquei a Meireles, sempre tive imensas dificuldades, porque procurei sempre uma abordagem pelo nascente, ou seja por terrenos de Vale Frechoso. O vale tem muitos acessos pelo poente, embora também haja zonas bastante rochosos, como o Faro. Hora, estou em crer que estas duas localidades não se devem dar muito bem, porque nunca procuraram abrir uma via de comunicação entre elas.
A minha mais recente tentativa de encontrar um caminho aconteceu no dia 20 de Dezembro. Fui de carro até cerca de 1,5 km do cruzamento da estrada de Vale Frechoso com a N214. Do lado esquerdo da estrada há uma zona de giestal onde foram abertas muitos corta fogos numa área ainda pertencente a Vale Frechoso que penso chamar-se Feiteira e Carvalhinho.
À minha esquerda via ao longe a Fonte do Seixo e o Cabeço dos Gaviões, onde adoro subir. À minha direita via recortado no horizonte o marco geodésico da Rosa, onde também já estive algumas vezes. À frente, entre mim e Meireles, adivinhava (mas não via) alguns cabeços rochosos, incluindo a Fraga Amarela.
Mal me afastei um pouco do caminho cheguei (de novo) à conclusão de que não é fácil andar por aqui. O mato é composto por giestas, estevas, carquejas, urzes e silvas. Atinge mais de um metro de altura e rasga tudo onde se espeta, seja tecido, seja carne. Encontrei dois bandos de perdizes, pelo menos elas gostam de andar nestes locais.
Procurei um ponto alto para me localizar. Os afloramentos rochosos atraíram-me e tentei romper por entre o mato para os alcançar. Desisti de procurar um caminho!
Quando me aproximei dos rochedos, uma ave de rapina que neles vigiava a paisagem, levantou voo. No meio da vegetação descobri algumas pedras ainda cobertas de geada. Há muitos amontoados de pedras soltas por todo o lado, estes terrenos devem outrora ter sido utilizados para a cultura de cereal. Pareceu-me que estes amontoados tinham uma configuração intencional, em curva, como que protegendo um pequena zona plana junto às rochas.
Aqui pode ter existido um castro! Há em redor muitos locais com evidências semelhantes, quase todas elas em pontos altos, com uma enorme protecção natural. São exemplos o Cabeço, o Faro, o Maragoto, o Facho, só para citar alguns. O lugar onde me encontrada estava naturalmente protegido num raio de mais de 180º, bastava uma pequena muralha para proteger quem quer aqui se quisesse proteger. Em termos de subsistência, o vale fértil, um pouco mais abaixo, a menos 200 metros de altitude não faltam bons terrenos e água, onde até rolavam moinhos. Pode ser imaginação minha, mas também pode não ser.
Em direcção ao aterro sanitário intermunicipal elevava-se uma escarpa rochosa que parecia intransponível. Impelido pela adrenalina das alturas, dirigi-me para ela. Havia várias grutas naturais escavadas nas rochas. Devem ter sido usadas durante séculos por pastores e caçadores, e sabe-se lá por quem mais. Numa delas havia uma curiosa construção de pedras soltas, estava ali a mão do homem. Noutra, muito maior, que tinha até uma abertura no tecto, adivinhava-se o desenho de algumas paredes rústicas já desaparecidas. Senti-me um verdadeiro homem das cavernas. O cenário ajudava a transportar-me para o época das cavernas, com a luz leitosa a tentar rasgar o nevoeiro do vale que, pouco a pouco, se sumiu num cachão do Tua, no Cachão. A luz, o frio e o silencia era tudo o que ali chegava. Sentei-me nas rochas sorvendo a paisagem, até que o sol se abeirou do Cabeço.
Quando o sol se escondeu, senti frio. De regresso à estrada surpreendi algumas codornizes que se preparavam para passagem a noite no restolho. Os últimos raios de sol pintavam de mosto o cume de Bornes.
Mais uma vez não descobri um caminho para Meireles, mas, e depois? É olhar que permite os mais belos passeios, mesmo quando os nossos passos não nos permitem atravessar todos os vales.
29 dezembro 2008
Mais presépios
Parece-me que a crise também se sente nos presépios e na iluminação de Natal. A quantidade é menor e a qualidade também não é muito surpreendente.
O presépio situado no escadório da Câmara Municipal, já é nosso conhecido. No ano passado esteve no Rossio, este ano mereceu esta posição de destaque. Não custava muito terem-lhe colocado uma lâmpada, para as noites de inverno não parecessem tão escuras.
Há um outro presépio na Praça da República, que pode passar desapercebido.
Não consegui encontrar o presépio que habitualmente faz o grupo de Escuteiros.
O presépio do Jardim-de-infância da Santa Casa da Misericórdia, arrecadou no ano passado o 1.º prémio no concurso de presépios. Este ano está igualmente bonito, ocupando uma grande área. Só é pena não o montarem mais próximo do gradeamento, para poder ser admirado com maior facilidade.
O presépio da Junta de Freguesia de Valtorno tem sido nos últimos anos, um dos meus preferidos. Este ano também já lhe fiz uma visita. Esperei que o sol se escondesse, mas a iluminação não se ligou e tive que me vir embora. Pareceu-me haver algum descuido na sua montagem, com imagens partidas e colocadas na colina sem grande sentido estético. O "pastor" assustador do ano passado, não apareceu por lá.
Para ver fotografias dos presépios de 2007
- Concursos de Montras e Presépios
- Uma visita a alguns presépios, em Vila Flor
O presépio situado no escadório da Câmara Municipal, já é nosso conhecido. No ano passado esteve no Rossio, este ano mereceu esta posição de destaque. Não custava muito terem-lhe colocado uma lâmpada, para as noites de inverno não parecessem tão escuras.
Há um outro presépio na Praça da República, que pode passar desapercebido.
Não consegui encontrar o presépio que habitualmente faz o grupo de Escuteiros.
O presépio do Jardim-de-infância da Santa Casa da Misericórdia, arrecadou no ano passado o 1.º prémio no concurso de presépios. Este ano está igualmente bonito, ocupando uma grande área. Só é pena não o montarem mais próximo do gradeamento, para poder ser admirado com maior facilidade.
O presépio da Junta de Freguesia de Valtorno tem sido nos últimos anos, um dos meus preferidos. Este ano também já lhe fiz uma visita. Esperei que o sol se escondesse, mas a iluminação não se ligou e tive que me vir embora. Pareceu-me haver algum descuido na sua montagem, com imagens partidas e colocadas na colina sem grande sentido estético. O "pastor" assustador do ano passado, não apareceu por lá.
Para ver fotografias dos presépios de 2007
- Concursos de Montras e Presépios
- Uma visita a alguns presépios, em Vila Flor
28 dezembro 2008
Presépio - Roios
À semelhança do ano passado, na freguesia de Roios fizeram um belíssimo presépio. Ainda pode ser admirado, junto à igreja matriz.
27 dezembro 2008
Salvé, Vila Flor
Ó Terra de encantos, terra fagueira,
Nobre vila, altas tradições -
Salvé, Vila Flor, ó mensageira
De grande história às gerações.
Terra de belezas que fazem sonhar
Quem sobre ti se puser em adoração.
Houve-se a tua voz na solidão,
Até melhor à luz terna do luar.
Salvé, Vila Flor, vila das pombas
Que passam a vida sempre a arrulhar
Em sois de Primavera, pelas alfombras
Sempre a voar, voar ... e voar...
Salvé Vila Flor, vila de amores,
Ó vila de encantos, sejas bem-vinda.
Sim! Vila terna, como és linda,
Terra querida dos nossos maiores...
O poema escrito por J. N. Fonseca foi publicado no jornal Notícias de Mirandela, em 15-10-1960.
A primeira fotografia mostra Vila Flor, depois do pôr do sol, em Dezembro de 2008.
A segunda fotografia mostra o início do vale onde se encontra Meireles. O Cabeço é visível na linha do horizonte.
Nobre vila, altas tradições -
Salvé, Vila Flor, ó mensageira
De grande história às gerações.
Terra de belezas que fazem sonhar
Quem sobre ti se puser em adoração.
Houve-se a tua voz na solidão,
Até melhor à luz terna do luar.
Salvé, Vila Flor, vila das pombas
Que passam a vida sempre a arrulhar
Em sois de Primavera, pelas alfombras
Sempre a voar, voar ... e voar...
Salvé Vila Flor, vila de amores,
Ó vila de encantos, sejas bem-vinda.
Sim! Vila terna, como és linda,
Terra querida dos nossos maiores...
O poema escrito por J. N. Fonseca foi publicado no jornal Notícias de Mirandela, em 15-10-1960.
A primeira fotografia mostra Vila Flor, depois do pôr do sol, em Dezembro de 2008.
A segunda fotografia mostra o início do vale onde se encontra Meireles. O Cabeço é visível na linha do horizonte.
26 dezembro 2008
À Descoberta, em BTT (2)
No dia 21 de Dezembro a Descoberta voltou às duas rodas. Aproveitei o Passeio organizado pelo Clube de Ciclismo de Vila Flor, de que sou sócio, para percorrer mais alguns caminhos, pelo concelho de Vila Flor.
As provas de BTT não são propriamente ocasiões propícias à admiração de bonitas paisagens ou mesmo a tirar boas fotografias. Perder um minuto para fotografar, equivale ficar na cauda do pelotão e nunca mais se recupera o atraso, principalmente para quem, como eu, descobriu as duas rodas já perto dos 40. Mas, tratando-se de um passeio, somente com sócios e amigos, o caso muda de figura.
A concentração aconteceu junto à Câmara Municipal, às 8:30 da manhã. Até o Menino Jesus, no presépio, se afundou na manjedoura, com o frio que fazia. Mas o sol brilhou! Esperava-nos um lindo dia.
Os trilhos percorridos eram meus conhecidos e já aqui tenho falado deles diversas vezes: Barragem Camilo Mendonça; Santuário de Santa Cecília; Valtorno; Seixo de Manhoses; Barragem de novo e Vila Flor.
Ao longo do percurso com aproximadamente 25 quilómetros, apreciei sobretudo um troço que ainda não conhecia, entre o quilómetro 14º e o quilómetro 18º. Já tinha estado em Valtorno, junto dos moinhos, mas não fazia ideia que havia tantos, pelo ribeiro abaixo. O trilho acompanha o ribeiro, a meia encosta, em direcção à Barragem Valtorno-Morão. Não chegámos à barragem, e o pelotão subiu a Seixo de Manhoses. Passámos num local onde se encontram nada menos do que 10 caminhos! Já várias vezes, quando estudava os mapas na Internet, me chamou à atenção esse ponto. Acho que é muito raro que aconteça uma situação destas, tantos caminhos a encontrarem-se todos num ponto! Num dos caminhos há um cruzeiro em granito.
O ritmo calmo e bem disposto imposto ao pelotão permitiu-me muitas pausas, fotografando a paisagem ou mesmo os participantes. De vários locais avistava-se o Vale da Vilariça, parecendo um imenso oceano de algodão doce. Estivemos a poucos metros de lhe tocarmos.
Já depois da uma da tarde foi servido o almoço no restaurante “O Zéquinha”.
Participaram neste passeio muitos jovens de Vila Flor, Carrazeda, Moncorvo e Macedo de Cavaleiros. Praticar BTT é um desporto que tem cada vez mais adeptos e atrai com facilidade os jovens. É saudável, em contacto com a natureza e reveste-se de uma cultura que me agrada muito. Quem bom existir em Vila Flor um clube que facilite este tipo de actividades!
Quilómetros em BTT neste percurso: 25
Total de quilómetros de bicicleta: 1922
Percurso:
24 dezembro 2008
Frio mas belo
Com esplêndidos dias de sol que temos apreciado na Vila, hoje senti a tentação de descer ao vale para ver o que se escondia por debaixo dos brancos lençóis que o cobrem já há vários dias. A Vilariça parece adormecida, à espera que grandes fogueiras acesas aqueçam o coração das aldeias e mandem embora o frio.
A meia encosta, onde a o manto se destapa durante a noite e o sol não aquece durante o dia, tudo se cobriu de um branco puro. Não é neve, é gelo! Estas pequenas maravilhas podem ser encontradas à volta de Sampaio e também em Santa Comba da Vilariça, quase até chegar a Vale Frechoso.
A temperatura das imagens contrasta a com aquela que se sente em todas as mensagens que me têm chegado, no blogue ou por email, mas a beleza é a mesma.
Um BOM NATAL.
A meia encosta, onde a o manto se destapa durante a noite e o sol não aquece durante o dia, tudo se cobriu de um branco puro. Não é neve, é gelo! Estas pequenas maravilhas podem ser encontradas à volta de Sampaio e também em Santa Comba da Vilariça, quase até chegar a Vale Frechoso.
A temperatura das imagens contrasta a com aquela que se sente em todas as mensagens que me têm chegado, no blogue ou por email, mas a beleza é a mesma.
Um BOM NATAL.
23 dezembro 2008
Universalidades
"Baixou a noite como um floco de algodão preto escorrendo pelas abas da serrania. Ao lusco-fusco recolheram os coelhos às luras, os insectos sobreviventes aos casulos, os morcegos aos ninhos, escondidos nas pedras velhas. Sob as pastas de musgo húmido e orvalhado, hibernam sardaniscas e lagartos ao calor das fermentações do folhiço morto.
Em galerias sinusoides, rosnam carunchos, nos troncos abatidos.
Requisitado pelas forças vivas da terra, aceitei a incumbência de elaborar uma reportagem da noite de Natal, essa noite lançada em ponte desde a tarde de 24 à madrugada de 25, desde o velho mundo ao novo mundo, desde a escuridão da descrença às claridades da Fé.
Mal as estrelas abriram os guichés, subi o caminho e meti-me ao mato. Não havia luar, mas a dois terços da escarpa uma manchazinha branca localizava a ermida de Nossa Senhora da Serra.
O mato é espesso, emaranhado de zimbreiros e verbascos, aroeiras, zambujeiros e silvas, folhagens tenras ou rijas, aqui picando as pernas, através do pano das calças - era a gilbardeira, mas como tinha as esferazinhas encarnadas, rainha do Natal, não me escandalizei; ali pegando-se às mãos, com resinas viscosas.
Em baixo, no descanso da várzea, corre o rio e amadornam as casas da aldeia, vivas nas múltiplas luzes que enchem as janelas.
O anoitecer veio calmo. Há sobre toda a Natureza uma bênção de pacificação que se sente com inteira verdade. Ela festeja, pelo aniversário do nascimento do Deus-Homem, a sua própria criação, concedida por Deus-Vida. Natural, portanto, que as folhas e as ervas, as rochas e os bichos festejem, como nós, a sublime Natividade de Belém.
Não se rasgou o reposteiro do templo; não se abalou o Céu com trovões dilacerantes e relâmpagos horríveis; não se abriram fendas na terra e não rebentaram os fraguedos - quando Jesus soltou o último suspiro no Calvário?
- Nada de admirar, por conseguinte, que desça uma bênção de paz e amor à bruta Natureza nos festivais o do aniversário do mesmo Jesus.
Meio perdido, amparando-me aos pinheiros, reparei numa cova onde um coelho me esperava. Se medo tinha, deitei-o para trás das costas e lá me enfiei pela cova dentro, a bisbilhotar a consoada dos láparos.
Vencido o corredor, escuro e comprido, surpreendi-me num antro espaçoso que duas pinhas de pirilampos alumiavam sofrivelmente.
Uns tantos coelhos roíam sossegadamente a ceia melhorada: rabanetes cenouras, talos de couves, que o hortelão da várzea lhes deixou à discrição quando foi apanhar as hortaliças para a ceia dos patrões.
Nada mais que sossego e confraternização, naquele matraquear contínuo de dentinhos, eu achei na toca dos roedores. Recuei, então, para não perturbar a familota com despedidas e cheguei ao ar livre, continuando as minhas visitas à bicheza da serra.
Dali a vinte passos estava a caminhar por uma galeria intrincada e extensa, onde me sentia como um metropolitano no seu túnel.
Não tardou que observasse um formigueiro completo circulando por ruas e largos duma autêntica vila subterrânea. À luz duns grãos de claridade que elas tinham amealhado durante os dias soalheiros de Outono, viam-se os banquetes de confraternização, puxados a montes de cereais e sementes doces, que as formigas devoravam cheiinhas de apetite.
Com dificuldade, lá dei com a saída, respirando fundo o ar livre, que as evaporações do mato tornavam balsâmico e aprazível. E nesse ar fresco do monte, abrigados pela ramagem duma urzeira branca, fui espreitar um casal de pintassilgos que no mais carinhoso enleio debicavam uma umbela de funcho e outra de alface espigada, saboreando as sementinhas com gula inocente de pássaros felizes.
A noite ia avançada. A fadiga e o frio obrigaram-me a dar por terminada a reportagem que os moradores da serra me pediram. Para quê, mais visitas? Em qualquer escaninho onde habite um ser vivo, aí a implícita festa do Natal, por instinto da própria criação, acreditam?
Todavia, na cabana do lenhador há já a solenidade consciente da Festa Alegre. Sobre as dificuldades do mester, e as incertezas da sua vida, e as sombras das suas necessidades, brilha naquela noite a centelha mágica do amor para todos os homens.
Todavia, na consoada lauta do banqueiro, entre as refulgências deslumbrantes dos lustres e candelabros, acantona-se a penumbra miudinha dum Menino que nasceu escondido, lá nos confins da Judeia.
Todavia, no cérebro do ímpio, do teimoso na incredulidade, do perjuro e do falhado, a marca do Natal punge como flecha em madeira mole.
O Natal é doce mão que afaga os três reinos do Universo inteiro!"
Artigo de Cabral Adão, publicado na Gazeta do Sul, a 23-12-1955
21 dezembro 2008
Apreciando a paisagem
Ontem saí num passeio a pé à procura de candidatos à Flor do Mês de Dezembro. Não encontrei flores, mas encontrei rochedos. Rochedos, nevoeiro, montes e ar, ingredientes mais de que suficientes para uma boa sessão de fotografia. Esta que mostro hoje foi complicada. O falcão, nos rochedos, parece extasiado com tom leitoso do vale. Eu fiquei maravilhado com o conjunto.
20 dezembro 2008
16 dezembro 2008
Imagens fugidias
No dia 30 de Novembro falei pela primeira vez com o escritor João de Sá. Depois de ler o seu primeiro livro "Versos para Vila Flor", senti-me imediatamente cativado pela sua forma de escrever. Creio que já li todos os livros e fui mostrando aqui, no blogue, pequenos pedaços que me apeteceu partilhar. Claro que a primeira coisa que fiz foi confessar o meu "pecado", de divulgar, sem autorização, algumas das pérolas que João de Sá escreveu. Como seria de esperar de uma alma sensível, não só se mostrou satisfeito, como me prometeu um novo livro que está prestes a ser editado. Infelizmente o dia foi muito preenchido e não houve possibilidade de conversar em profundidade com o escritor, mas, logo que ele volte a Vila Flor, tentarei de novo colocar-lhe algumas questões que me surgiram à medida que lia os seus livros.
O poema de hoje, de que gosto muito, faz parte do seu último livro "Vila à Flor dos Montes". Trata-se de uma colectânea de poemas, compilados para o livro, mas que foram escritos ao longo de alguns anos. Inclui um conjunto de poemas de Natal, muito adequado para a época que se aproxima.
Imagens fugidias
As fotografias são do dia 16 de Dezembro. Quase ao pôr-do-sol, subi ao miradouro e à Nossa Senhora da Lapa e tirei um bom conjunto de fotografias. A magia que se via lá do alto, era inacreditável.
O poema de hoje, de que gosto muito, faz parte do seu último livro "Vila à Flor dos Montes". Trata-se de uma colectânea de poemas, compilados para o livro, mas que foram escritos ao longo de alguns anos. Inclui um conjunto de poemas de Natal, muito adequado para a época que se aproxima.
Imagens fugidias
Tudo o que é leve
Venha visitar-me:
A neve, sobretudo a neve.
O fumo branco
Que se liberta, à tarde,
Dos fornos de cozer o pão.
O gesto e o amassar,
A doçura do levedar.
A transpiração da terra.
A chama da candeia
- Pérola de resina
Que se incendeia.
O orvalho na pétala da rosa
Inexistente.
O roçagar da asa
De uma ave, sem pressa,
Brandura de fruto a amadurar.
A cama,
Aquele jeito de nos acolher
E a toalha da mesa
Tão perto de nos dizer
Os segredos
Da água e do vinho.
As madressilvas
Ornando a parede do caminho.
A criança que passa,
Atravessando a manhã,
Ao encontro da beleza total
De uma abelha
Afagando uma flor que desfalece,
E, ao olhar para trás,
Desaparece.
As fotografias são do dia 16 de Dezembro. Quase ao pôr-do-sol, subi ao miradouro e à Nossa Senhora da Lapa e tirei um bom conjunto de fotografias. A magia que se via lá do alto, era inacreditável.
15 dezembro 2008
As feiras
"Os dias 15 e 28 de cada mês constituíam, para mim, verdadeiros acontecimentos.
Muito cedo ainda era acordado pelo barulho e azáfama com que na Praça eram colocadas umas longas mesas de madeira, com pernas em X, devidamente travadas. Muitas vezes eram ligadas entre si por estrados que partiam dos tampos, proporcionando uma maior exposição de mercadorias.
Aos poucos iam chegando os tendeiros que armavam as respectivas tendas e começavam a dispor a mercadoria.
Desde muito novo que recordo a curiosidade com que, cara encostada às vidraças da nossa casa, observava a agitação do montar da feira...
Volta que não volta, chegavam camionetas de carga, com bancos em U, ao correr dos taipais e por trás da cabine, ficando o estrado reservado às mercadorias.
Algumas, mal descarregavam, partiam de novo, para regressar com mais pessoas e carga.
A Praça que, normalmente me parecia grande, tomava-se pequena, os passeios cheios dos mais variados produtos agrícolas, conforme a época do ano.
Não se pense, contudo, que havia confusão: tudo tinha o seu lugar certo, previamente determinado.
Assim, no passeio nascente, desde a Farmácia do Hospital até ao sóto do Barroco era o lugar das hortaliças e outros vegetais, intervalados pelas bancas de tremoços e castanhas da Olímpia e da Sara Pechorra, bem como dos frangos e galinhas vivos, ovos e demais criação.
Do outro lado, havia as doceiras que vendiam rebuçados caseiros, embrulhados em papel de seda e que sabiam melhor do que os das lojas.
Ao lado vendia-se trigo e centeio, medido pelos rasões da Santa Casa com os respectivos rasoiros.
A norte, ocupando todo o passeio e a rua em frente da casa das minhas primas Paulas, ficavam as tendas propriamente ditas, que ocupavam ainda todo o passeio da zona ajardinada.
Havia de tudo, para todos os gostos, desde o capote alentejano, com gola de raposa, passando palas samarras, calças, sapatos, lingerie, artigos de ménage e ferramentas agrícolas.
Pelo meio havia sempre o vendedor da banha de cobra que, desde as lêndeas aos calos e à dor de dentes, tinham remédio milagroso para tudo e todos.
Apareciam os ceguinhos que tocavam e cantavam letras de sua autoria, autênticas tragédias que contavam crimes hediondos e outras tragédias, e que em seguida vendiam os respectivos folhetos.
Indispensáveis também eram os ourives que, para além do ouro e prata, vendiam relógios.
Junto à capela do Santo Cristo situavam-se as padeiras, quase todas de Samões que, para além dos borneiros de alvo trigo e côdea estaladiça vendiam o centeio mais saboroso que já provei e que tantos anos depois ainda me fazem água na boca.
Mas logo a seguir vinha o meu mundo, os brinquedos.
Nesta época de electrónica, em que as crianças desde a mais tenra idade só já conhecem videogames e dissertam sobre software e megabits, seria difícil explicar-lhes a alegria, o prazer com que olhávamos, mesmo sem comprar, uma junta de bois de barro, as bandas de músicos com os seus componentes de casaco azul, calças brancas, boné de pala arredondado e os automóveis de lata que não pretendiam ser a escala reduzida de nenhum modelo.
Mas, havia-os também de madeira, menos numerosos e imaginativos. Eram, basicamente, uma pomba com rodas que agitava as asas quando empurrada por uma pega situada no extremo oposto ou um ciclista que pedalava tão intensamente quanto o ritmo imposto pelo sistema da pomba. Por vezes a imaginação dos artistas ia mais além e aparecia um minúsculo carro de bois, carregando uma pipa.
Aos meus olhos de então, tudo era um deslumbramento, um mundo diferente ainda que muito visto, com aquela capacidade de fazer de conta que só as crianças conseguem; sonhava possuir aquilo tudo, brincar com cada uma daquelas maravilhas, soprando em cada flauta ou ocarina de barro uma melodia que ecoasse do Facho a Bornes...
Se tivesse tudo aquilo já não precisaria de brincar ao eixo, à bilharda, ao pião ou ao carolo com os berlindes que outra coisa não eram do que esferas de rolamentos estragados que o Fernando Cepeda me oferecia.
Mas, a realidade vem sempre interromper o sonho e era arrancado ao meu deleite para, pela mão de meu Avô, irmos à feira das "bestas".
Esta era no Toural, que também servia de campo de futebol e onde, posteriormente foi edificado o actual Hospital que assim saiu das velhas instalações do Rossio.
Vila Flor nunca foi célebre por feiras de gado. Raramente apareciam bovinos, tudo se resumindo a um comércio de burros, muares, um ou outro cavalo, mas essencialmente ovinos, caprinos e suínos.
Compradores e vendedores discutiam preços. Abriam os beiços aos animais, viam-lhes os dentes para determinar a idade, alegavam virtudes ou defeitos, conforme a posição negocial.
Estabeleciam-se igualmente as condições contratuais de pormenor, tais como se a albarda e a cabeçada estavam ou não incluídos no preço.
Depois de uma longa conversa, o comprador adiantava a sua oferta, com o ultimato de que não desembolsaria nem mais um centavo.
O vendedor persistia no preço pedido, como também se de um ultimato se tratasse, cedendo, quando muito, nos arreios.
O negócio ficava, quase sempre por um fio, dada a irredutibilidade de cada
um, até que intervinha um terceiro que assistira a todas as negociações e que dava a chamada "rachadela" que se traduzia na metade da diferença entre pedido e oferta, e que, normalmente, consubstanciava o desejo de ambas as partes que fingiam não transigir.
Concluído o negócio, vendedor, comprador e rachador iam à tasca mais próxima celebrar o acordo, o que se chamava pagar o alboroque.
O dia ia correndo. As pessoas, na Praça, transportavam já diversos embrulhos.
O sol ameaçava esconder-se por detrás da casa da D. Nazaré; os tendeiros começavam a arrumar as suas mercadorias; as sobras dos produtos hortícolas eram ensacadas e carregadas nos burros ou mulas que os haviam transportado e que ansiavam por voltar ao curral.
As pessoas começavam a partir e as camionetas vinham efectuar o transporte de regresso...
A praça ia ficando, pouco a pouco, deserta, abandonando na calçada os vestígios das transacções efectuadas ou goradas A rosa Varredeira iniciava a tarefa de limpeza.
Todo aquele esplendor que marcava ainda um resto de costumes medievais - atente-se que os intervenientes não eram chamados feirantes mas sim tendeiros - desaparecia como que por encanto.
Olhando todo aquele vazio que fazia com que a Praça voltasse a ser enorme, ficava desejando a nova feira que tudo acontecesse do mesmo modo, um modo que, apesar de tudo, me parecia sempre diferente. Era meu secreto desejo que fosse sempre dia de feira."
O texto foi extraído do livro de António Meireles, Vila Flor - Memórias de um outro tempo, recentemente editado pela Câmara Municipal de Vila Flor.
Notas: Das fotografias que ilustram o texto, três são actuais e duas são antigas, restauradas a partir dos originais.
A primeira das fotografias antigas, mostra a Praça da República em 1945. Foi tirada de perto da Casa Africana em direcção à esquina por onde sobe a avenida em direcção ao actual edifício da Câmara Municipal. Em 1949 a avenida já tinha sido rasgada e algumas casas demolidas.
A segunda fotografia antiga, da autoria de Soveral Pastor e datada de 1933, mostra a entrada do Toural Novo e a escola do sexo masculino, à direita.
Muito cedo ainda era acordado pelo barulho e azáfama com que na Praça eram colocadas umas longas mesas de madeira, com pernas em X, devidamente travadas. Muitas vezes eram ligadas entre si por estrados que partiam dos tampos, proporcionando uma maior exposição de mercadorias.
Aos poucos iam chegando os tendeiros que armavam as respectivas tendas e começavam a dispor a mercadoria.
Desde muito novo que recordo a curiosidade com que, cara encostada às vidraças da nossa casa, observava a agitação do montar da feira...
Volta que não volta, chegavam camionetas de carga, com bancos em U, ao correr dos taipais e por trás da cabine, ficando o estrado reservado às mercadorias.
Algumas, mal descarregavam, partiam de novo, para regressar com mais pessoas e carga.
A Praça que, normalmente me parecia grande, tomava-se pequena, os passeios cheios dos mais variados produtos agrícolas, conforme a época do ano.
Não se pense, contudo, que havia confusão: tudo tinha o seu lugar certo, previamente determinado.
Assim, no passeio nascente, desde a Farmácia do Hospital até ao sóto do Barroco era o lugar das hortaliças e outros vegetais, intervalados pelas bancas de tremoços e castanhas da Olímpia e da Sara Pechorra, bem como dos frangos e galinhas vivos, ovos e demais criação.
Do outro lado, havia as doceiras que vendiam rebuçados caseiros, embrulhados em papel de seda e que sabiam melhor do que os das lojas.
Ao lado vendia-se trigo e centeio, medido pelos rasões da Santa Casa com os respectivos rasoiros.
A norte, ocupando todo o passeio e a rua em frente da casa das minhas primas Paulas, ficavam as tendas propriamente ditas, que ocupavam ainda todo o passeio da zona ajardinada.
Havia de tudo, para todos os gostos, desde o capote alentejano, com gola de raposa, passando palas samarras, calças, sapatos, lingerie, artigos de ménage e ferramentas agrícolas.
Pelo meio havia sempre o vendedor da banha de cobra que, desde as lêndeas aos calos e à dor de dentes, tinham remédio milagroso para tudo e todos.
Apareciam os ceguinhos que tocavam e cantavam letras de sua autoria, autênticas tragédias que contavam crimes hediondos e outras tragédias, e que em seguida vendiam os respectivos folhetos.
Indispensáveis também eram os ourives que, para além do ouro e prata, vendiam relógios.
Junto à capela do Santo Cristo situavam-se as padeiras, quase todas de Samões que, para além dos borneiros de alvo trigo e côdea estaladiça vendiam o centeio mais saboroso que já provei e que tantos anos depois ainda me fazem água na boca.
Mas logo a seguir vinha o meu mundo, os brinquedos.
Nesta época de electrónica, em que as crianças desde a mais tenra idade só já conhecem videogames e dissertam sobre software e megabits, seria difícil explicar-lhes a alegria, o prazer com que olhávamos, mesmo sem comprar, uma junta de bois de barro, as bandas de músicos com os seus componentes de casaco azul, calças brancas, boné de pala arredondado e os automóveis de lata que não pretendiam ser a escala reduzida de nenhum modelo.
Mas, havia-os também de madeira, menos numerosos e imaginativos. Eram, basicamente, uma pomba com rodas que agitava as asas quando empurrada por uma pega situada no extremo oposto ou um ciclista que pedalava tão intensamente quanto o ritmo imposto pelo sistema da pomba. Por vezes a imaginação dos artistas ia mais além e aparecia um minúsculo carro de bois, carregando uma pipa.
Aos meus olhos de então, tudo era um deslumbramento, um mundo diferente ainda que muito visto, com aquela capacidade de fazer de conta que só as crianças conseguem; sonhava possuir aquilo tudo, brincar com cada uma daquelas maravilhas, soprando em cada flauta ou ocarina de barro uma melodia que ecoasse do Facho a Bornes...
Se tivesse tudo aquilo já não precisaria de brincar ao eixo, à bilharda, ao pião ou ao carolo com os berlindes que outra coisa não eram do que esferas de rolamentos estragados que o Fernando Cepeda me oferecia.
Mas, a realidade vem sempre interromper o sonho e era arrancado ao meu deleite para, pela mão de meu Avô, irmos à feira das "bestas".
Esta era no Toural, que também servia de campo de futebol e onde, posteriormente foi edificado o actual Hospital que assim saiu das velhas instalações do Rossio.
Vila Flor nunca foi célebre por feiras de gado. Raramente apareciam bovinos, tudo se resumindo a um comércio de burros, muares, um ou outro cavalo, mas essencialmente ovinos, caprinos e suínos.
Compradores e vendedores discutiam preços. Abriam os beiços aos animais, viam-lhes os dentes para determinar a idade, alegavam virtudes ou defeitos, conforme a posição negocial.
Estabeleciam-se igualmente as condições contratuais de pormenor, tais como se a albarda e a cabeçada estavam ou não incluídos no preço.
Depois de uma longa conversa, o comprador adiantava a sua oferta, com o ultimato de que não desembolsaria nem mais um centavo.
O vendedor persistia no preço pedido, como também se de um ultimato se tratasse, cedendo, quando muito, nos arreios.
O negócio ficava, quase sempre por um fio, dada a irredutibilidade de cada
um, até que intervinha um terceiro que assistira a todas as negociações e que dava a chamada "rachadela" que se traduzia na metade da diferença entre pedido e oferta, e que, normalmente, consubstanciava o desejo de ambas as partes que fingiam não transigir.
Concluído o negócio, vendedor, comprador e rachador iam à tasca mais próxima celebrar o acordo, o que se chamava pagar o alboroque.
O dia ia correndo. As pessoas, na Praça, transportavam já diversos embrulhos.
O sol ameaçava esconder-se por detrás da casa da D. Nazaré; os tendeiros começavam a arrumar as suas mercadorias; as sobras dos produtos hortícolas eram ensacadas e carregadas nos burros ou mulas que os haviam transportado e que ansiavam por voltar ao curral.
As pessoas começavam a partir e as camionetas vinham efectuar o transporte de regresso...
A praça ia ficando, pouco a pouco, deserta, abandonando na calçada os vestígios das transacções efectuadas ou goradas A rosa Varredeira iniciava a tarefa de limpeza.
Todo aquele esplendor que marcava ainda um resto de costumes medievais - atente-se que os intervenientes não eram chamados feirantes mas sim tendeiros - desaparecia como que por encanto.
Olhando todo aquele vazio que fazia com que a Praça voltasse a ser enorme, ficava desejando a nova feira que tudo acontecesse do mesmo modo, um modo que, apesar de tudo, me parecia sempre diferente. Era meu secreto desejo que fosse sempre dia de feira."
O texto foi extraído do livro de António Meireles, Vila Flor - Memórias de um outro tempo, recentemente editado pela Câmara Municipal de Vila Flor.
Notas: Das fotografias que ilustram o texto, três são actuais e duas são antigas, restauradas a partir dos originais.
A primeira das fotografias antigas, mostra a Praça da República em 1945. Foi tirada de perto da Casa Africana em direcção à esquina por onde sobe a avenida em direcção ao actual edifício da Câmara Municipal. Em 1949 a avenida já tinha sido rasgada e algumas casas demolidas.
A segunda fotografia antiga, da autoria de Soveral Pastor e datada de 1933, mostra a entrada do Toural Novo e a escola do sexo masculino, à direita.
13 dezembro 2008
Notícias de Vila Flor
Não sou o único a notar que a comunicação social regional dá muito pouca importância ao que se passa em Vila Flor. Todos sabemos que se trata de um pequeno concelho; todos sabemos que as notícias negativas são mais mediáticas, mas não custa tentar.
Peguei nas notas do meu post sobre o Cinquentenário do Museu Berta Cabral, resumi-as num pequeno texto a que juntei duas fotografias e enviei o conjunto, por email, para dois jornais editados no distrito.
Fiquei satisfeito quando vi que o texto foi publicado no Jornal Nordeste, do dia 9 de Dezembro. Estranhamente, não é feita qualquer indicação de quem é o autor e o texto foi “cozinhado” por quem não colocou os pés no evento, cometendo alguns erros. Na frase “Ambos os escritores são filhos da terra e, através do trabalho de poesia “Vila à Flor dos Montes”, João de Sá descreve “quadros” dos anos 40 e 50, que guardou na memória quando foi viver para Lisboa”, fizeram um caldo do escritor João de Sá e do livro “Vila Flor – Memórias de um outro tempo”, da autoria de António Meireles. Neste último é que são visitados locais e recordadas personagens dos anos 40 e 50.
Devo acrescentar que já escrevi à direcção do jornal, mas não recebi qualquer explicação.
Para cúmulo, esta não é a segunda nem a terceira vez que estas coisas acontecem, tendo até em casos anteriores, doutros jornais, os artigos sido assinados por jornalistas depois de serem quase copiados letra a letra deste blogue e a fotografias adulteradas para apagar o meu nome.
Este procedimento vindo de profissionais, não dignifica os respectivos órgãos de comunicação social e retiram muito do entusiasmo a quem despende muito da sua vida para construir este “cantinho” agradável.
Notas:
- O primeiro artigo digitalizado tem o texto (adulterado) que enviei por email e a fotografia que coloquei no post do dia 1 de Dezembro "50 anos - Museu Drª Berta Cabral"
- O segundo artigo digitalizado foi publicado no Mensageiro. Foi escrito com base na minha reportagem aqui no Blog que pode ser lida aqui. Também a fotografia pode ser vista aqui, foi habilmente recortada.
- O terceiro artigo (não sei em que jornal saiu, só o descobri há poucos dias), foi redigido com base naquilo que escrevi no Blog do Clube de Ciclismo de Vila Flor, que pode ser lido aqui. A fotografia também é minha, tem o meu nome e pode ser vista aqui.
12 dezembro 2008
Flor do Mês - Novembro de 08
Com a chegada do frio (até já veio a neve!), as flores silvestres começam a ser cada vez mais raras. Mais raras não quer dizer mais feias, ou menos coloridas. Escolhi para o mês de Novembro a flor do Medronheiro (Arbutus unedo). Este bonito arbusto de folhas persistentes, verdes e lustrosas, tem muitos atractivos. Tem frutos saborosos de tons variados conforme o estado de maturação, terminando num vermelho vivo tão ao estilo das cores nacionais e natalícias. Em simultâneo, apresenta também flores. A floração acontece de Outubro a Fevereiro. As flores são hermafroditas, brancas com matizes verde ou rosa, formam inflorescências em panículas pendentes (cachos pendentes).
Além de os frutos serem muito apreciados (fiz no ano passado um bom licor de medronhos), é um arbusto bastante apreciado como planta ornamental pelo conjunto de cores das folhas, flores e frutos.
No concelho de Vila Flor é possível encontrar medronheiros em bastantes locais. Aqui ficam alguns: Serra do Facho; Serra do Faro; estrada da Ribeirinha; Meireles (junto á estrada); entre o Arco e o Nabo; Gavião; Alto da Caroça, etc.
Nota: aceito indicações para a flor do mês de Dezembro.
Além de os frutos serem muito apreciados (fiz no ano passado um bom licor de medronhos), é um arbusto bastante apreciado como planta ornamental pelo conjunto de cores das folhas, flores e frutos.
No concelho de Vila Flor é possível encontrar medronheiros em bastantes locais. Aqui ficam alguns: Serra do Facho; Serra do Faro; estrada da Ribeirinha; Meireles (junto á estrada); entre o Arco e o Nabo; Gavião; Alto da Caroça, etc.
Nota: aceito indicações para a flor do mês de Dezembro.
Subscrever:
Mensagens (Atom)