23 fevereiro 2023

A velha praça



A velha Praça começava
Onde findava
A nossa inquietação.
Varandas engalanadas
E janelas sempre acesas.
Harpejos de comoção
Libertados dum piano,
Na branda respiração
Das tílias quase apagadas
No crepúsculo de Verão.

E nós a vermos os outros.
Sobretudo a vermo-nos passar
Desde o começo do mundo,
Tentando dissimular
O abismo mais profundo,
Com um candil de luar.

Poema de João de Sá, do livro "Vila à Flor dos Montes", 2008.
Fotografia: Praça da República, em Vila Flor, antes do último arranjo urbanístico. 

João Baptista de Sá, nasceu em Vila Flor, a 7 de Novembro de 1928. Faleceu no dia 23 de Fevereiro de 2012, em Lisboa.


07 janeiro 2023

Vento (João de Sá)



Ó este vento que me torce a alma,
Olhando as chamas, no espaldar do escano,
Tecendo o tempo em fios de ano e ano,
Voraz caruncho que ninguém acalma.

Volúvel, este vento amanhecendo...
Corte de longe em coração cigano.
Breve pausa de engano e desengano,
Clamor que me estrutura, corroendo...

Fecho o livro que lia. O impossível
Avantaja-se e torna-se audível,
Mas nada se aproxima que transgrida:

O bater duma porta, uma telha
Partida, vozes, passos numa quelha,
Seja o que for que arremede a vida!

Poema de João de Sá, do livro "Vila à Flor dos Montes", 2008.
Fotografia: A caminho da Ribeirinha, na Quinta da Peça.


01 janeiro 2023

Caminhos (João de Sá)

Que todos os caminhos que descubro
Me descubram também, e neles encontre
Uma fimbria longínqua de horizonte
Desenhando, a névoa, um céu de Outubro.

Das auroras de Agosto o gesto rubro
Se torne voz, me acalente e conte
A odisseia dessa velha fonte
Que emudeceu e nunca disse tudo!

Buscai-me nos caminhos. Sou o monge
Que vem não sabe donde, mas de longe...
Trago textos no olhar, parai e lede.

Eu sou o viajante e a viagem,
Latejo de seara e a própria aragem,
A frescura da água e o ardor da sede!

Poema de João de Sá, do livro "Vila à Flor dos Montes", 2008.
Fotografia: Caminho para o Santuário da Nossa Senhora dos Remédios, em Vilarinho das Azenhas

24 junho 2022

Luís Cabral Adão, 112 anos


Completam-se hoje 112 anos desde o nascimento de Luís Cabral Adão. Nasceu em Vila Flor, Trás-os-Montes, no dia 24 de Junho de 1910, tendo falecido em Almada a 6 de Agosto de 1992. 
No dia 18 de Setembro, integrada na homenagem que lhe foi feita pelo município de Vila Flor, foi descerrada uma placa no escadório do Cabeço de Nossa Senhora da Assunção, em Vilas Boas. Essa placa contém um soneto de sua autoria, publicado em livro em 1966, "Vila Flor" (Versos).
Na fotografia podemos ver o presidente da Câmara nessa altura, Dr. Artur Pimentel, acompanhado dos filhos do homenageado.


Imagem, das formosas, mais formosa:
Senhora d'Assunção, no pico agreste,
Vestido cor de pétalas de rosa,
Manto volátil de cetim celeste!

Única imagem, esta que assim veste
E numa nuvem se ergue, vaporosa,
Braços ao alto, olhos como em teste
De em si conter centelha milagrosa!

Transfigurada estátua que eu venero
Desde menino, e a que tanto quero
Por me rasgar de luz a densa treva:

Em ser's da Virgem Mãe cópia fiel,
Volve pra mim teus olhos d'ouro e mel,
Dá-me um lugar na nuvem que te leva!

Soneto retirado do livro “Versos – Vila Flor”, impresso em Novembro de 1966, da autoria do Dr. Luís Cabral Adão.

26 janeiro 2021

e de repente é noite


Faz alguns anos que comecei a partilhar o livro  "E de repente é noite", do ilustre vilaflorense falecido em 2012, João de Sá. Nestes dias de confinamento, em que o tempo parece que nos sobra, chega-nos para fazermos viagens musicais, de imagens e palavras que preencheram os nossos dias, num passado mais ou menos longínquo. E, no quente da lareira, ao ritmo da chuva que ora quer cair, ora se envergonha, os sentimentos emergem e dão-nos alento. Saibamos aproveitar estes dias para nos (re)encontrarmos, porque a loucura em que vivemos dá-nos poucas hipóteses.




INDICE
Faço isto em nome de um fogo distante
É para reavivar as obliquas luzes da memória
Dizer os ventos que atravessaram
Por onde caminhamos é o dia
Quem deu nome a esses espaços
Fixa a mão o que Junho não foi
Nos vasos do coração
Não tem nome a barca
Demoro-me sob as romãzeiras
Não me despertes para o festim
A cidade rarefaz-se ao longe
Estão por lá, bem sei, todas as palavras
Que os instantes do dia
Deixai a criança sentada no granizo
A impetuosa deambulação do álcool da escrita
Acenas-me de longe
Onde estavas tu no início desse verão
Saber como são breves
Em Maio os campos acendiam-se
Sabíamos a alba uma tela branca
Havia um poço
Todos desapareceram
Sei que o corredor me levava
A charneca de yorkshire aberta
Os ventos afinam os violinos dos choupos
Ficar em paz com as coisas
O sol atravessado pelas sombras
Vou pelo assombramento de quartos e salas
É dorido o canto
Ardem pássaros nos olhos dum rapaz
Basta um caminho
Já ninguém lembra o que sobrou de nós
Os teus passos são ímpetos entardecidos
Não é sono nem desmaio nem esquecimento
Segredos de obscuros cristais
Que o gume das colinas
Não aceites a morte, mãe
Outra vez o serão
Nunca disseste que virias
Uma vereda de desassossego
Passei por ti como luz branda
Sentemo-nos na soleira da porta
Pousaram nenúfares na água do teu peito
Ergue as palmas de um saber feito
Que mãos sacodem velhas ferrugens
Que realidade procuram surpreender
Não reduzas tudo a esquadria e pedra
O tempo pousa-me nos dedos
Andei perdido por caminhos ínvios
Vou aparelhar as tábuas do barco

João Baptista de Sá, nasceu em Vila Flor, a 7 de Novembro de 1928.
Faleceu a 23 de Fevereiro de 2012.

24 junho 2020

No vale da Vilariça



- Bonito dia, Rosária!
- Bonito dia, Gonçalo!
Não eram os personagens do «Idílio Rústico», que Trindade Coelho tão finamente bordou, mas um casal de jovens e de trabalho que morava em Sampaio, lá para as bandas da Vilariça, entre Vila Flor e Moncorvo. Tinham-se acabado de erguer, estrelas ainda a brilhar no azul, mas já esmaecidas pela aproximação do sol. Era naquele Agosto ardente, tão ardente que até se assava uma sardinha posta na hora da sesta em cima duma fraga.
O dia ia a romper depressa e o Gonçalo entrou logo de aparelhar os burros e preparar os sachos para marchar direito à canameira, a meia légua de distância de sua casa.
A Rosária já tinha posto na mesa de castanho, preto de velho, os figuitos e a aguardente do mata-bicho e começava a apanhar no Cabanal alguns guiços bem sequinhos para adiantando o almoço que, por volta das onze horas, ia levar ao seu homem: e até o Zé, raparigo dos seus sete anos, filho do casal, dava os últimos amanhos às costelas e pescoceiras, untando de cuspo as tranquetas dos sedenhos daqueles  e experimentando as molas destas, e verificava se as formigas de ala estavam bem presas e vivas nas grileiras das armadilhas, cevadas de véspera, pois esperava fazer uma boa colheita de tralhões, rabitas, piscos e folecras. E lá vai ele com o pai, que já desce a ladeira, burricos à frente com angarelas, sachos e apetrechos vários sobre as albardas.
As margens do vale são alinhadas e bastante abruptas. Quer dos lados de Vila Flor, quer dos de Alfândega da Fé ou Moncorvo, desce-se muito para se lá chegar. Segue ao longo da Ribeira, desde os cerros de Bornes até ao rio Douro, onde estronca em esquadria.
A canameira do Gonçalo, herdança do seu falecido e bom pai, era uma larga faixa de terreno, começando no caminho marginal e acabando na Ribeira. ladeada pelas courelas dos vizinhos.
Quase ao centro, via-se uma nora de alcatruzes zincados que trazia à água de pequena profundidade até à altura de um metro, suficiente para chegar à todos os cantos do terreno.
Aquelas terras são de uma fertilidade extraordinária!
E este ano, especialmente, que houve «rebofa»!
Quem conheceria aquela extensa planura cobertinha de água que transborda, vale acima, do endemoinhado Douro, muito subido pelas chuvas torrenciais de muitos dias?
Aquela água toda, com um rico nateiro de naturais e fortes adubos, dava à Vilariça o grandioso aspecto dum lago, como outrora dizem que foi, e à ubérrima seiva que vicejará nos seus belos e afamados frutos.
Santa terrinha esta, em cujo seio exubera o sagrado mistério da germinação, no dizer de Campos Monteiro, que a cantou!
E o Gonçalo bem lhe conhecia o valor! Se era quase só dela e do trabalho aturado dele e da própria patroa que viviam!
E governaram-se regularmente, pois tinham um bem fornecido bragal, boa adega com salgadeira, a pipa do carrascão, as linguíças, embrulhadas em velhos envelopes. Numa caixa de madeira, a talha das azeitonas, a arca do azeite, o garrafão da aguardente, uma tulha de pão, um monte de batatas, cabos de cebolas e alhos ao dependuro; e lá no canto da arca, escondia-se uma boa maquia forra.
Muita fartura para os três, muita poupança, mas nada de luxos ou gulodices.
— Eh! burros! Xó!
Mal chegou. o Gonçalo atrelou um burro ao pau da nora, com um frondoso ramo de salgueiro escarranchado no cachaço, para o aliviar da mosca.
O outro iria pastar até chegar a sua vez.

O nosso Zé, com um pequeno sacho, ia fazendo terra fresca, aqui e além, em lugares adrede,  junto dos poisos certos da passarada. arrumado a uma árvore ou a um poste da vinha ou à um merouço com silvas, onde armava as costelas de maneira que o sol. logo ao nascer, fizesse rebrilhar bem às asas das formigas, isca muito apetecida e difícil de arranjar.
O pai, deixando o jerico sozinho a puxar à nora, foi para a horta, de sacho às costas, a guiar à água que, pelas augueirras, corria aos diversos talhos dispostos com simetria. Aqui um talho de cebolo, ali outro de tomates, além de pimentos, de feiões, de abóboras ou botelhas, de pepinos, de cenouras e tal e tal e, mais ao fundo, junto à Ribeira, uma grande extensão onde medrava o «fruto», melancias e melões que faziam boa figura nos mercados próximos.
Alfaces tentas e couves galegas estendiam-se ao longo das augueiras; e no entre-meio de alguns regos e nas pontas das rodeiras, até se aproveitavam os beldros, óptimos para o caldo, que ali cresciam ao Deus-dará.
E à rega ia-se fazendo lentamente, num abrir e fechar de regos que o sacho de Gonçalo operava numa roda viva.
Uma ou outra vez, à água nunca mais chegava ao fundo dum rego, pois se escoava pela buraca de alguma toupeira, à qual não tinha sido afuguentada pelo cadáver duma outra, morta na véspera e espetada numa rodriga a dois ou três pés do chão.
Tapada a buraca por meia dúzia de chuçadas com o olho do sacho, a regra continuava.
Por volta das onze, pela hora velha, quando o Gonçalo soltava o burro para o largar no pasto ao pé do outro e o Zé regressava com alguns pássaros da caçada, chegava a Rosária, de cesta à cabeça, coberta com uma taleiga vazia em que havia de levar, no regresso, alguns pimentos para a ceia.
Dirigira-se para a cabana de colmo, prantada na sombra duma grande nogueira.
O calor já era sufocante e todos limpavam o suor da cabeça e do tronco por entre os peitos das camisas largamente abertos.

Estendido o almoço no chão, sobre uma toalha de linho, alva retesada pelo cloreto, os três se abeiraram da comida, munquindo-lhe e bebendo-lhe assim como manda à lei! O caldo dos tais beldros, muito gostòzinho, o bacalhau com batatas, regados a azeite e vinagre vindos em garrafinhas, e a bela pinga da cabaça que refrescava as secas guelas (até o Zé bebia uma chícara dele!).
Depois... ficavam todos a fazer de jibóias, para ali deita- dos cada um a sua sombra.
Que calmaria durante aquelas horas de sesta! Muito calor, o zumbido das vespas em volta de alguma poça de água que ficou da rega, nem o pio dum pássaro, nem o cri-cri dum grilo!
Mais tarde, ainda com bastante calor, recomeça o trabalho.
Quando a camioneta da carreira subiu a estrada por altura dos Nuzelos, nas ladeiras em frente, o nosso bom Gonçalo já andava com os burros jungidos à charrua, a lavrar a restolha da trigueira. O Zézito, finda a caçada e levantadas as armadilhas, (a tarefa rendeu doze tralhões, três rabitas, e alguns centieiros) tinha ido à Junqueira, povoação na margem oposta do vale, junto à estrada, levar um recado ao seu padrinho Sá Lemos. Ao chegar lá a casa, ficou espantado de ver os filhos do padrinho muito bem postos, com andainas novinhas e gravatas de seda!
Perguntando a um deles os motivos de tanto luxo, foi-lhe respondido que o pai tinha encontrado uma panela de moedas romanas, ao surribar uma terra para bacelo e que o Senhor  Soveral Pastor, de Vila Flor, muito amigo de coisas antigas, lhas tinha comprado por bom preço! Intervindo, o padrinho do Zé deu-lhe a bênção e disse-lhe que já não era a primeira vez nem a segunda que por ali apareciam potes de barro a abarrotar de ricas peças do tempo dos romanos. E havia também muitas pedras de túmulos. Não, que toda a vizinhança era rica de coisas históricas!
Aquela estrada que passava no alto das Quintas do Zimbro e da Tarrincha, foi feita pelos romanos. E as ruínas daquele castelo, frente à Quinta da Silveira, sobre o cabeçozito que se eleva entre o sabor e a Ribeira? Esse não sabia de que data era, mas sabia que deu nome ao vale, pois foi sede dum povoado que se chamava Vila Rica de Santa Fé.

Cumprida a missão, o Zé voltou à canameira muito admirado do que tinha ouvido.
Quase ao toque das Trindades, carregadas as angarelas dos jumentos com algumas botelhas, bandeiras de milho e vagens de feijão, lá seguiram ladeira acima, a caminho de casa, o Gonçalo e o filho, pois a senhora Rosária já tinha abalado, para tratar da ceia.
Junto à fonte das águas minerais, de muita fama para as doenças de estômago, encontraram um grupo de pessoas lá do povo que comentavam um episódio muito engraçado, sucedido na véspera.
Foi o caso que o João Rendeiro, cuja mulher andava para toda a hora, ao despertar, de madrugada, sentiu com os pés uma coisa a mexer-se no fundo da cama; e, certificando-se do que era, deu uns empurrões à patroa gritando-lhe:
- Acorda, oh, Rosa! Olha que já te nasceu o raparigo!

Texto retirado livro Paisagens do Norte, da autoria de Luís Cabral Adão, publicado em 1954. Luís Cabral Adão nasceu em Vila Flor, Trás-os-Montes, no dia 24 de Junho de 1910, tendo falecido em Almada a 6 de Agosto de 1992. Os restos mortais foram sepultados no cemitério da terra natal, assim se concretizando um anseio que expressamente havia manifestado.

Cabral Adão - Síntese Biográfica


01 novembro 2016

Já se passaram 10 anos

É verdade, já decorrem 10 anos desde que começou a aventura À Descoberta de Vila Flor.  A data do aniversário é 3 de setembro, mas este ano não tive direito a bolo ou champanhe para a festa. Mesmo assim, sem festa e em data atrasada, não quero deixar de fazer o balanço de mais um ano decorrido.
Já vai longe o entusiasmo inicial, de percursos semanais, cada vez mais distantes, percorrendo o vales mais recônditos ou o cume dos montes. Os anos vão passando e fui-me acomodando, a "descobertas" que exigem menos esforço, mas que deixam muito a desejar no prazer da descoberta. Já há muito afastado da bicicleta, restam os percursos pedestres, com muito poucos caminhos para descobrir. A parte mais saborosa destes anos foi quando ninguém me conhecia. Fazia os percursos, vibrava com as fotografias, escrevia as reportagens como quem fazia um diário,revivendo cada metro percorrido ou cada fotografia tirada. Não esperava nada de ninguém, nem ninguém esperava nada de mim. A partir de certa altura tornei-me mais urbano e o contacto com as pessoas nem sempre é motivante para darmos mais de nós.
Com a facilidade com que se publica e se descarta a informação nas redes sociais, escrever um texto com o mínimo de coerência e estrutura torna-se uma tarefa pesada. A diferença deu-se quando comecei a escrever para os outros, mais do que para mim. A fraca frequência com que o blogue foi actualizado contrasta com o dinamismo da página do Facebook que administro, que já soma alguns milhares de seguidores. Mas não é a mesma coisa. É verdade que é no facebook que estão as pessoas, mas também é aí que tudo é volátil, descomprometido e falso, de certa forma.
Das poucas caminhadas que fiz durante um ano houve uma que merece destaque. Tratou-se de uma ida de Freixiel à Quinta do Pobre, durante o mês de março. Percorrer mais uma vez o vale da Cabreira, numa altura em que a vegetação despertava do seu sono invernal foi muito entusiasmante. As condições atmosféricas também contribuíram, com alterações significativas desde o sol à chuva "molha tolos", terminando a caminhada com um fantástico céu azul pincelado de nuvens brancas.
De 3 de setembro de 2015 a 3 de setembro de 2016 aconteceram grandes alterações na minha vida e na da minha família. Momentos delicados, uns felizes, outros nem tanto, mas que mereceram prioridade sobre a actividade de "vagabundo" fotográfico, no concelho de Vila Flor e fora dele. A prova de hoje estar aqui, a escrever, é a de que segui em frente e estou preparado para o 11.º ano, à procura de singularidades que me surpreendam, me arrepiem, que me façam sentir que vale a pena viver aqui.
À semelhança dos anos anteriores, é a altura de dar uma vista de olhos aos números.
Números do 10.ºano:
Páginas vistas - 15.117
Visitantes -  10.598
Comentários - 8
Postagens - 5
Km percorridos em BTT - 0
Km percorridos a pé -  34
Fotografias tiradas - 9.671
Fotografias publicadas -  15


Números totais (10 anos):
Páginas vistas - 771,713
Visitantes - 365.062
Comentários - 1 896
Postagens - 1 157
Km percorridos em BTT(10 anos) -  2.297
Km percorridos a pé (6 anos) -  952
Fotografias tiradas - 161.320

31 outubro 2016

Caminhada pela Fragada

 A Junta de Freguesia de Santa Comba da Vilariça organizou no dia 29 de outubro uma caminhada, caminhada pela Fragada.
A vontade de organizar a caminhada já surgiu há algum tempo, mas só agora se reuniram as condições para a poder por no terreno. A hora não não foi a mais propícia, 15 horas de sábado, mas foi escolhida tendo em conta a realidade local, em que muitas pessoas trabalham ao sábado de manhã e também o facto de no domingo ser dia de caça.
Compareceram um pouco mais de 40 caminheiros, de todas as idades e com vontade de conhecer (ou de rever passados muitos anos) a Fragada.
O local situa-se entre a aldeia de Santa Comba da Vilariça e Bemlhevai, próximo do IP2. Tal como o nome deixa antever, trata-se de um lugar agreste, situada numa cota bastante mais alta do que Santa Comba da Vilariça e que permite uma excelente vista para o vale da Vilariça.
Aproveitou-se também a caminhada para uma sensibilização da população para o problema do cancro, uma vez que o dia 30 de Outubro ser o Dia Nacional contra o Cancro de Mama. Muitas pessoas vestiam peças de roupa brancas ou rosa e foram distribuídos balões cor-de-rosa.
 Depois de verificadas as inscrições e ser distribuída a mochila com água, uma peça de fruta e uma barrinha de cereais, o grupo partiu em direção à Fragada. A subida era íngreme, e apesar do caminho ser bastante bom, fazia muito calor e alguns sentiram alguma dificuldade.
 Diminuiu-se o ritmo para manter o grupo junto e seguiu-se em frente ouvindo as história de por quem já por ali tinha andado à cortiça, com o gado ou à caça."Andai lá ovelhinhas, cada sobreiro "bota" um Viriato", ouviu-se a certa altura. Ficamos a saber que houve tempos bem mais difíceis, tempos em que até a Fragada era importante (e guardada).
Depois de atingido o ponto mais elevado do percurso a paisagem fez esquecer o suor e a descida foi feita entre momentos de boa disposição e de contemplação. Um roco apareceu a lembrar a época dos cogumelos.
No final da caminhada o Sr. Presidente da Junta mostrou-se satisfeito com a adesão conseguida nesta primeira edição. Agradeceu a presença de todos e prometeu novas caminhadas no futuro.
O evento teve o apoio da Câmara Municipal e do Grupo Desportivo de Santa Comba da Vilariça.

07 novembro 2015

Deixa falar o silêncio

Foi para ti, quenquer que sejas, que se aformoseou este recinto.
Superaste até o atingires, o cansaço da subida.
Convido-te a um instante de recolhimento.
Bem mereces uma pausa de harmonia interior.
Não procures palavras, deixa falar o silêncio.
João de Sá

Completou-se mais um aniversário do nascimento do grande poeta vilaflorense João de Sá. Para lembrar a data subi ao miradouro. Deliciei-me com as suas palavras e com a paisagem vibrante numa hora de sol num dia de nevoeiro.
Vaguei pelas capelinhas e senti que João de Sá estava lá, no coloridos das folhas, nas gotas do orvalho da manhã, nos cogumelos que crescem no humus e no melro azul que guarda os rochedos. Quantas poemas João de Sá terá recitado a esta ave solitária?
Deixei que o vento me sussurrasse alguns versos ao ouvido e prometi voltar mais vezes para lhe fazer alguma companhia.

22 setembro 2015

e de repente é noite (XXXVII)

XXXVII
Não aceites a morte, mãe,
recusa-a em consonância
com o coração da terra.
sê a firmeza
daquela rocha lilás
onde o vento inutilmente
se esfacela.

XXXVIII
Outra vez o serão.
O piano perfurando
a densidade do tédio.
Estilhaços do temporal
da tarde
perseguindo o voltear
dos zilros.
Ah o perfume da serra
roendo-nos os zincos da alma.
É urgente uma jaula
de esquecimento
para este grito.

Poema de João de Sá, do livro "E de repente é noite", 2008.
Fotografia: Trabalho com base num jovem sobreiro fotografado em Benlhevai.

18 setembro 2015

e de repente é noite (XLVIII)

O tempo pousa-me nos dedos,
sugerindo aquele esbelto pássaro,
à tarde, hirto em tuas espáduas nuas.
Uma maré de crisântemos ritma
a tua impaciência em desejares
que seja no teu peito
que os braços se encontrem com o mar.
Em Março, no adro da capela, minhas tristezas
florescem acácias amarelas
e perpetuam-se na vibração dos sinos.
Um estranho toque
vem despertar setembros
de cachos de uvas suspensos do tecto,
na frescura das salas,
listando o espaço de tons mansos
como quem tece casulos de calor
para vencer o inverno.

Poema de João de Sá, do livro "E de repente é noite", 2008.
Fotografia: Cume do Facho, após um incêndio.